XV DOMINGO DO TEMPO COMUM-Ano C
«Então vai e faz o mesmo»
P. Osório Citora, IMC
A parábola do Bom Samaritano não nos oferece somente o conceito do “próximo”, mas sobretudo como conceber e viver a caridade ao amar o próximo com gestos concretos: aproximou-se, ligou-lhe as feridas deitando azeite e vinho, colocou-o sobre a sua própria montada, levou-o a uma estalagem e cuidou dele. É isto que se deve fazer, por isso Jesus conclui com o seguinte convite: «então vai e faz o mesmo» (Lc 10, 37). O “fazer o mesmo” como fez o bom samaritano não está acima das nossas forças nem fora do nosso alcance, como disse Moisés no Livro do Deuteronómio: “não está no céu e nem além dos mares, mas é o mandamento do amor que está perto de nós, está na nossa boca e no nosso coração, para que o possamos pôr em prática».
A palavra de Deus está muito próxima de nós, está na nossa boca e no nosso coração
Na primeira leitura, extraída do Livro do Deuteronómio, Moisés fala ao seu povo pronunciando que Deus colocou a Sua Lei – amar a Deus e ao próximo – nos nossos corações para que possamos facilmente pô-la em prática. Amar Deus e ao próximo não deve ser um compromisso estranho para nós e inatingível, mas uma realidade concreta e manifesta, que está nos nossos corações e nos nossos lábios, o importante é colocá-la em prática. Não há desculpa: a Lei do amor está próxima na vida das pessoas, e como acrescenta o Salmo 18, é perfeita, verdadeira, justa, clara, fiel, mais preciosa que o ouro e mais doce que o mel. A Lei do Amor é o caminho que ajuda a vida e para segui-lo é preciso a conversão: “e converter-te-ás ao Senhor teu Deus com todo o teu coração e com toda a tua alma” (cf. Dt 30,10). Como vimos no Evangelho, o samaritano é a personificação e o modelo daqueles que vivem o mandamento do amor porque o mandamento de “amar o próximo” está escrito no seu coração, não é algo estranho e nem muito menos inatingível. Por isso, ao ver o homem ferido, ele aproximou-se, colocou nas feridas azeite e vinho e as ligou, posteriormente colocou-o sobre a sua própria montada, levou-o a uma estalagem e cuidou dele.
“E quem é o meu próximo?”
O texto de Lc 10,25-37 está dividido em duas partes: dois diálogos entre Jesus e o doutor da lei. A primeira, é provocada por uma pergunta feita pelo doutor da lei: “que hei-de fazer para receber como herança a vida eterna?”; a segunda, inicia com uma outra pergunta realizada pelo mesmo doutor da lei: “E quem é o meu próximo?”. A primeira pergunta, tem como resposta: “amar a Deus e ao próximo” e, consequentemente, provoca a segunda pergunta: “quem é o meu próximo? Em resposta, Jesus conta a parábola de um homem que estava de viagem, descia de Jerusalém a Jericó, caiu em mãos de salteadores, os quais roubaram-lhe tudo, o espancaram e o deixaram meio morto. Três personagens que representam duas categorias de pessoas: por um lado, o sacerdote e levita fazem parte da categoria dos religiosos. Estes são pessoas oficialmente designadas para o serviço do culto. Os sacerdotes eram os ministros da adoração em Israel, desempenhando várias funções como de intermediários entre Deus e os homens. Os levitas, por sua vez, eram os seus auxiliares dos sacerdotes. Por outro lado, o samaritano que fazia parte dos excomungados do povo judeu. De facto, os samaritanos não eram um povo simpático aos judeus, e vice e versa.
Enquanto os dois primeiros, veem o infeliz a morrer e, portanto, a precisar da sua ajuda, passam sem fazer nada; por outro lado, o samaritano, não só fica cheio de compaixão, como também, se aproxima e coloca-se ao lado da pessoa necessitada com gestos concretos. Pouco depois, Jesus retomou o diálogo com o doutor da Lei reformulando completamente a questão colocada no versículo 29: não é uma questão de saber “quem é o meu próximo?” Mas, Jesus pergunta: “qual destes três te parece ter sido o próximo daquele homem que caiu nas mãos dos salteadores?” E o doutor da lei respondeu: “O que teve compaixão dele”.
Ter compaixão é a chave para compreender a questão: “quem é o meu próximo?” Enquanto o sacerdote e o levita, com as suas regras de culto litúrgico, passam diante do ferido e o contornam, sem cuidar dele. Jesus, por outro lado, caracteriza a reacção do samaritano com um verbo muito especial: “estar cheio de compaixão” (σπαγχνίζομαι). (do latim cum patior – eu sofro com…). De facto, o Doutor da Lei, na sua resposta sobre qual dos três era próximo, não cita categorias de pessoas, funções, mesmo distinções doutrinárias, nacionalistas e moralistas, mas diz: “aquele que usou de misericórdia”. As acções do samaritano são sintetizadas em sentimentos profundos de “compaixão”, uma atitude misericordiosa que é uma caraterística fundamental de atitude de Deus.
O coração da parábola é “compaixão” que não é beatismo, sentimentalismo, uma emoção forte que logo se desvanece. Pelo contrário, a compaixão é uma comoção visceral que exprime uma atitude interior face a um homem sofredor. Desta visão e deste ‘movimento das vísceras’ (emoção das vísceras), surgem ‘atitudes’ e um ‘fazer’: ‘foi ter com ele, atou-lhe as feridas, deitou óleo e vinho sobre elas, colocou-o na sua própria montada, levou-o a uma estalagem e cuidou dele’. A proximidade é um feito que se concentra na dor da outra pessoa e não no meu próprio sentimento. Existem dez verbos seguidos para descrever o amor e a compaixão: ele viu-o, moveu-se pela compaixão, desceu, derramou, enfaixou, carregou… até ao décimo verbo: voltarei e pagarei, tanto quanto for necessário.
Enquanto para o sacerdote e o levita, o homem meio-morto é um obstáculo, para o samaritano é uma razão de proximidade. Os primeiros não só o ignoram, como também demostram indiferença, ao distanciarem-se dele, contornando-o como um obstáculo’. Apesar que o escriba tenha evitando de usa a palavra samaritano, reconhece-o como uma referência a seguir (Lc 10,37). Jesus, com dois imperativos – vai e faz -, convida o doutor da lei a ser discípulo do “Bom Samaritano”, o que pode ser desconfortável, pois normalmente se pensa que só se pode ser discípulo de Jesus. Assim, somos também convidados a ser “próximo” do outro.
A questão colocada a Jesus pelo doutor da lei, “Quem é o meu próximo?”, transforma-se na seguinte pergunta: “Como é que um se torna o ‘próximo’ dos outros? Um torna-se “próximo” quando eu me faço “vizinho” do outro! “Próximo” não é só o outro!!! “Próximo” é aquele que sabe avizinhar-se, que vai ao encontro do outro que precisa de nós.
O discípulo missionário, segundo o Papa Francisco, “não deve catalogar os outros para decidir quem é o seu próximo e quem não o é. Depende de mim, ser ou não ser próximo da pessoa com a qual me encontro e que tem necessidade de ajuda, mesmo que seja desconhecida, ou talvez até hostil, a decisão é minha. Jesus conclui: «Vai, e também faz tu o mesmo» (v. 37). É uma boa lição! E repete-a para cada um de nós: «Vai, e também faz tu o mesmo», tornando-te próximo do irmão e da irmã que tu vês em dificuldade. Praticar boas obras, não apenas pronunciar palavras que o vento leva. Surge-me ao pensamento uma canção: «Palavras, palavras, palavras…». Não!”