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SCEAM Declaração aos Participantes nas Reuniões da Primavera de 2022 da Grupo do Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional

Comissão De Justiça, Paz E Desenvolvimento

Esta declaração é um convite aos delegados das reuniões de Primavera de 2022 do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Grupo do Banco Mundial para utilizarem os recursos e oportunidades à sua disposição para ajudar a moldar uma economia que proteja melhor a dignidade e os direitos básicos das pessoas em todo o mundo.

Acreditamos que as Reuniões de Primavera deste ano irão desenvolver iniciativas que apoiarão os governos a trabalhar para o benefício de todos e evitar a implementação de medidas que isolam ainda mais os pobres e os vulneráveis. Esperamos que os delegados nestas reuniões discutam não apenas a economia global em termos do que ela produz, mas também a forma como ela toca e promove a vida, como ela protege a dignidade da pessoa humana e a integridade da criação.

Queremos ampliar a voz do Papa Francisco na defesa da dignidade da pessoa humana e reiteramos as suas palavras para apelar por uma economia que dê vida em vez de uma economia que mate. Enquanto trabalhamos para  recuperação, evitemos regressar a um modelo desigual e insustentável da vida económica e social, onde uma pequena minoria da população mundial possui a metade da sua riqueza, em detrimento de milhões de pessoas vivendo abaixo do limiar da pobreza. Precisamos de desenvolver sistemas sociais e económicos que apoiem a distribuição da riqueza e orientem o ser humano para ser inclusivo e eliminar a desigualdade económica da sociedade.

Embora a pandemia de Covid-19 tenha afectado todos os povos e nos tenha mostrado como somos interdependentes e interligados, também revelou quão dividido e desigual é o nosso mundo. Enquanto que, desde que a pandemia se abateu, as economias avançadas empregaram com força os instrumentos fiscais e financeiros para responder à crise, os países africanos não tinham meios para mobilizar recursos suficientes para responder à pandemia e tinham de fazer escolhas impossíveis entre salvar vidas e empregos, ou pagar aos credores. Numa região que alberga dois terços dos pobres extremos do mundo, mais de 40 milhões de africanos caíram na pobreza extrema sem acesso a bens e serviços básicos como a saúde, educação, alimentação, água, etc, devido aos duros impactos económicos da Covid-19.

Preocupa-nos que a nossa região continue a ser a menos vacinada do mundo, expondo o nosso povo a novos surtos de coronavírus e a perturbações económicas e prolongando a crise. Os progressos no sentido dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável e da realização da Agenda 2063 Africana estão ameaçados. África é também o continente mais vulnerável às alterações climáticas, com efeitos visíveis na perda de terra arável e água causada pela seca, maior incidência de desastres naturais e deslocamento forçado. Estes são efeitos de uma economia insustentável que despoja a criação. Como afirmou o Papa Francisco, “não estamos perante duas crises distintas”, uma ambiental e outra social, mas sim com uma crise complexa que é simultaneamente social e ambiental”.

O impacto da crise do coronavírus na saúde e na economia agravou o peso da dívida préexistente em África. A dívida em proporção da dimensão da economia africana aumentou de 60% para 70% à medida que a procura de despesas aumentava, e as receitas caíam a pique. Reiteramos o apelo do Presidente do nosso Corpo Regional de Bispos Católicos em África (SCEAM), Sua Eminência o Cardeal Phillippe Ouedraogo, que na sua mensagem de Ano Novo de 2022 desejou “para o nosso continente uma boa recuperação económica, livre de dívidas que a têm estrangulado”. Se a isto acrescentarmos as consequências económicas da guerra na Ucrânia, tais como a inflação galopante que está a ganhar terreno em todo o lado, podemos imaginar que a situação se agravará para aqueles que lutam pela sobrevivência, com o risco de motins alimentares em zonas propensas à fome.

Apelamos aos Ministros das Finanças do G20 e a outros líderes mundiais reunidos nas reuniões de Primavera do FMI/Banco Mundial, para que ponham em prática os planos viáveis para que a África saia da crise com resiliência e retomem o progresso no sentido dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, da Agenda Africana 2063 e do Acordo de Paris. Apelamos ainda aos líderes mundiais para que providenciem liderança e coordenem esforços no sentido de reunir credores públicos e privados para criar mecanismos para reduzir o insuportável peso da dívida que muitos países da nossa região continuam a enfrentar. Estes mecanismos devem ser utilizados para mecanismos eficazes e imediatos de suspensão do pagamento da dívida dos países que procuram apoio.

A agência e a responsabilidade dos líderes africanos é essencial para alcançar esses objectivos, mas exigirá uma grande dose de apoio externo por parte da comunidade internacional. No anopassado, o FMI criou 650 mil milhões de dólares em Direitos de Saque Especiais para a resposta ao coronavírus e ajuda à recuperação. Saudamos estes recursos que são rápidos, sem condições e acrescentam pouca ou nenhuma dívida, mas preocupa-nos que, deste montante, apenas 33 mil milhões de dólares foram para países Africanos.

Pedimos que os países ricos, que receberam mais de 400 mil milhões de dólares nessa afectação, canalizem uma parte significativa dos seus DSE para os países africanos, para apoiar os esforços locais de compra de vacinas e adaptação às alterações climáticas. Embora o compromisso do G20 de re-canalizar 100 mil milhões de dólares seja um bom começo, acreditamos que eles podem fazer mais. Gostaríamos também de afirmar que se deve ter cuidado para que os veículos de canalização de DSE protejam a sustentabilidade da dívida e evitem condicionar as transferências sobre políticas que agravam a pobreza, o desenvolvimento humano ou o acesso a serviços essenciais.

Apelamos ao início de um processo no sentido de uma nova atribuição de DSE, a um nível suficiente para pelo menos triplicar os recursos que a África recebeu da última vez. Os líderes mundiais deveriam também rever o método de distribuição dos DSE de modo a que a sua atribuição esteja mais alinhada com as necessidades dos beneficiários.

Finalmente, apelamos a uma nova arquitectura financeira internacional que previna futuras crises de dívida com três elementos essenciais. Primeiro, a adopção de regras e políticas responsáveis de empréstimo e contracção de empréstimos, incluindo a divulgação de contratos de dívida e quadros de autorização. Segundo, a partilha justa de riscos entre credores e devedores por catástrofes naturais e outros choques externos. Terceiro, fontes suficientes de financiamento concessional a longo prazo para o desenvolvimento, com políticas incorporadas para proteger a transparência e a sustentabilidade da dívida.

Acra, 19 de Abril de 2022
Bispo Sithembele Sipuka
Primeiro Vice-Presidente do SCEAM e Presidente da Comissão