General

Chamados a partilhar os dons recebidos e a cuidar uns dos outros

XVII DOMINGO DO TEMPO COMUM, Ano B
1L 2 Reis 4,42-44; Ef 4,1-6; Ev João 6,1-5

A liturgia do XVII domingo Comum do Ano B apresenta-nos a preocupação de Deus em saciar a “fome” de todos os seus filhos e filhas. Convida-nos a abrir os nossos corações à partilha, à fraternidade, à responsabilidade pela “fome” dos nossos irmãos. Pois na primeira leitura, o profeta Eliseu manda distribuir pelas pessoas que o rodeiam os pães que lhe foram oferecidos. Com o seu gesto Deus nos quer ensinar a partilha, a generosidade, a solidariedade. Similarmente no Evangelho, Jesus oferece aos discípulos e à multidão o “sinal” da multiplicação dos pães e dos peixes. O seu gesto “abre os olhos” dos discípulos e fá-los perceber que só a lógica da partilha, da gratuidade, do dom generoso, do serviço humilde podem multiplicar o “pão” que sacia a “fome” do mundo. Só assim poderá nascer um mundo mais humano, mais solidário, mais fraterno. Neste momento em que muitas partes do nosso planeta estão assoladas pela fome e seca devido ao fenómeno El Niño, a partilha revela-se um imperativo.

Nos dois textos está claro que Deus serve-se dos homens para intervir no mundo e para fazer chegar ao mundo os seus dons.

O gesto de partilha de Eliseu é, sem dúvida, um antídoto contra o egoísmo, contra o açambarcamento, contra a ganância, contra o fechamento em si próprio, tendência do mundo actual. É um gesto que anuncia um mundo novo, um mundo transformado, um mundo solidário, um mundo construído ao estilo de Deus, um mundo onde todos os filhos e filhas de Deus têm lugar à mesa da vida e da esperança. É o mundo defendido pelo Papa Francisco na Fratteli Tutti.

Alguns dos que testemunharam a multiplicação dos pães e dos peixes têm consciência de que Jesus é o Messias que devia vir para dar ao seu Povo vida em abundância e querem fazê-lo rei (vers. 14-15). Mas Jesus não aceita. Ele não veio resolver os problemas do mundo instaurando um sistema de autoridade e de poder; mas veio convidar os homens a viverem numa lógica de partilha e de solidariedade, que se faz dom e serviço humilde aos irmãos. É outra lição para qualquer líder, mormente que está ao serviço do Evangelho, a não ceder à propostas alciantes que podem distrair ou disvirtuar a missão a que foi confiado pelo dono da messe.

Na segunda leitura, Paulo lembra aos crentes algumas exigências da vida cristã, base para uma verdadeira comunidade cristã. Recomenda-lhes, particularmente, a humildade, a mansidão e a paciência, atitudes que não se combinam com esquemas de egoísmo, de orgulho, de autossuficiência, de preconceito em relação aos irmãos. Vai mais adiante, pedindo, que os irmãos se preocupem uns com os outros, apoiando-se, ajudando-se e cuidando-se mutuamente.

A Igreja que está na África definiu-se como Igreja Família de Deus. O que é típico de uma famíla é precisamente a preocupação recíproca dos membros de uma família. Na linguagem actual, pode-se dizer que é um convite à sinodalidade, a qual somos todos chamados a abraçar porque é a Igreja do Terceiro Milénio.

Porque a comunidade nascida de Jesus não pode viver de outra forma senão na unidade e na comunhão. Só vivendo unidos eles podem dar um testemunho coerente de Cristo e do mandamento do amor. ‘Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros’, diz o Senhor (Jo 13,35). Infelizmente, não é raro encontrar comunidades cristãs feridas por divisões, tribalismo, regionalismo, rivalidades, invejas, ciúmes, divergências inconciliáveis, jogos de influência etc. Isto acontece porque os membros da comunidade ainda não descobriram os fundamentos da sua fé.

Para que a unidade seja possível, Paulo recomenda aos destinatários da Carta aos Efésios a humildade, a mansidão e a paciência. Porque são atitudes opostas aos esquemas de egoísmo, de orgulho, de autossuficiência, de preconceito em relação aos irmãos.

Como foi dito acima, a preocupação de Jesus com a “fome” daquela multidão que o segue, revela a preocupação de Deus em dar a todos os seus filhos e filhas Vida em abundância. Porém, apesar da generosidade de Deus, os dons que Ele coloca à nossa disposição nem sempre chegam à mesa de todos. Isto é devido ao facto de alguns homens e mulheres, por egoísmo e ganância, abocalharem os dons que pertencem a todos os filhos e filhas de Deus.

O “pão” que Jesus faz distribuir à multidão faminta refere-se a algo mais do que o pão material que mata a nossa fome física. Aquelas pessoas que correm atrás de Jesus para saciar a sua “fome” são aqueles homens e mulheres que, todos os dias encontramos nos caminhos que percorremos e que, de alguma forma, estão privados daquilo que é necessário para viver uma vida digna… Os “que têm fome” são os que são explorados e injustiçados e que não conseguem libertar-se; são os que vivem na solidão, sem família, sem amigos e sem amor; são os que têm que deixar a sua terra e enfrentar uma cultura, uma língua, um ambiente estranho para poderem oferecer condições de subsistência à sua família; são os marginalizados, abandonados, segregados por causa da cor da sua pele, por causa do seu estatuto social ou económico, ou por não terem acesso à educação e aos bens culturais de que a maioria desfruta; são as crianças que sofrem violência; são as vítimas da economia global.

Jesus dirige-Se aos seus discípulos e diz-lhes, referindo-se à multidão faminta: “dai-lhes vós mesmos de comer”. Fica assim clara a responsabilidade dos discípulos de Jesus em saciar a “fome” do mundo e em repartir o “pão” que mata a fome de vida, de justiça, de liberdade, de esperança, de felicidade de que os homens sofrem.

Aquele povo ia atrás de Jesus “para a outra margem” por ser um Povo marcado pela opressão, que quer experimentar a libertação, situação de muitas pessoas do nosso tempo. Vão atrás de Jesus porque já perceberam que só Jesus conseguirá ajudá-los a superar a sua condição de miséria e de escravidão. É uma lição para o nosso tempo, com muitos a oferecerem soluções enganosas.

Na procura de respostas para a fome daquela gente, Jesus envolve o grupo dos seus discípulos (“onde havemos de comprar pão para lhes dar de comer?” – vers. 5. Hoje ele envolve a nós seus seguidores.