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«Vamos nós também, para morrermos com ele» (Jo 11,16)

DOMINGO V DA QUARESMA
Leituras do dia: Ez 37,12-14; Salmo 129 (130); Rom 8,8-11; Jo 11,1-45

Caros irmãos e irmãs!
Estamos já caminhando a passos largos rumo a reta final do nosso percurso quaresmal. As leituras deste domingo nos fazem saborear com antecedência o tema da ressurreição. Na primeira leitura, extraída do livro do profeta Ezequiel, o Senhor Deus dirige uma palavra de esperança aos exilados que vivem numa situação de opressão e desespero que pode ser comparada com a morte. Para o profeta, a restituição da liberdade é obra de Deus. É Deus que se engaja na restauração da vida dos exilados e que os reconduz à sua terra, símbolo de autonomia e liberdade.
Em outras tradições proféticas, especialmente em Oséias e Jeremias, esta ação divina é justificada pela compaixão e fidelidade de Deus para com o seu povo. Contrariamente a Oséias e Jeremias, em Ezequiel, o acento está no Senhor que pretende reivindicar a Sua própria reputação e glória postas em questão pela profanação da parte dos filhos de Israel (cf. Ez 36,22-23). Seja como for, a primeira leitura deste domingo nos revela que tudo é graça. Graça que porém deve ser acolhida com generosidade e reconhecimento. Deus se empenha a reabilitar a humanidade destruída, não por mérito, mas pela Sua benevolência, como afirma o salmista: «Se tiverdes em conta as nossas faltas, Senhor, quem poderá salvar-se?» (Salmo 129,3).

Por sua vez, o evangelho nos apresenta o episódio tradicionalmente conhecido como ressurreição de Lázaro. Tal como o do cego de nascença do domingo anterior, o cenário da ressurreição de Lázaro é uma narração engenhosamente construída de tal modo que suscita inquietações e provocações ao leitor. O narrador não se precipita em terminar o relato; enuncia os acontecimentos fornecendo o máximo de informação inclusive a manifestação interior das personagens.

Se bem que o tema central da narração é a ressurreição de Lázaro a favor dos discípulos e dos judeus presentes para «acreditarem» no Messias (cf. vv. 15.42), interessa-nos também, de modo particular, a reação dos discípulos que temem ir de novo para a Judeia porque a sua meta é Jerusalém, «o trono de glória» (cf. Mc 10,37). Este medo manifestado claramente no versículo 8 («Mestre, ainda há pouco os judeus procuravam apedrejar-Te e voltas para lá?»), vem realçado na afirmação quiçá sarcástica de Tomé quando diz: «vamos nós também, para morrermos com ele» (v. 16). É como quem diz «aqui termina a aventura de seguir Jesus: morrer apedrejado em vez de sentado ‘um à direita e outro à esquerda’ do Seu trono» (cf. Mc 10,37; Mt 20,21).

Lida no âmbito do seguimento de Cristo, a atitude hesitante dos discípulos de voltar à Judeia é um apelo para todos os seguidores de Cristo: não há ressurreição sem morte, e nem há vitória sem batalha. É preciso ousar «ir de novo para a Judeia», enfrentar o risco de ser apedrejado, para que o Lázaro possa ressuscitar. Em vez de dizermos «vamos nós também, para morrermos com ele», digamos «vamos nós também, para morrermos por ele». Este é o «espírito de Cristo» – «morrer por», e não «morrer com» – de que nos fala São Paulo na segunda leitura quando diz: «Mas, se alguém não tem o Espírito de Cristo, não Lhe pertence» (Rm 8,9). Que o Senhor nos ensine a morrer cada dia, para darmos a vida a tantos ‘Lázaros’ privados dos seus direitos e com dignidade enterrada.