Caríssimos irmãos e irmãs
O tema das leituras deste domingo é fácil de identificar. Qualquer que seja a formulação que atribuirmos, a palavra-chave é «amor». Enquanto ela recorre várias vezes na segunda leitura e no evangelho, não aparece explicitamente na primeira leitura. Todavia, a linguagem aqui empregada deixa claro o nexo existente entre esta leitura e as restantes. A afirmação de São Pedro o justifica: «Deus não faz acepçao de pessoas». Na verdade, «ele que faz raiar o seu sol sobre maus e bons e faz cair a chuva sobre justos e injustos» (Mt 5,45), concede a salvação tanto aos judeus como aos gentios, não por mérito próprio, mas por sua bondade e misericórdia.
A perícope do evangelho deste domingo é a continuação do evangelho do domingo passado onde Jesus se apresentava como a verdadeira vide e os seus discípulos os sarmentos. As duas perícopes constituem uma única sequência. O objectivo do discurso não é advertir os infiéis ou ameaçá-los com o juízo final, mas sim exortar os discípulos a permanecerem unidos a Jesus no período pós-Pascal. A união orgânica dos ramos ao tronco de que nos falava a perícope do domingo passado é interpretada na perícope deste domingo como participação dos discípulos no amor de Cristo.
A exortação de permanecer no seu amor significa simplesmente que o amor não pode ficar sem resposta. O amor deve estimular os discípulos a darem testemunho fiel da sua amizade com gestos concretos que se manifestam no amor fraterno. Todavia, como diz o Papa Francisco, «amar os irmãos não é fácil, porque apresentam-se imediatamente os seus defeitos e as suas faltas, e voltam à mente as feridas do passado» (Homilia, Basílica de S. Paulo Fora dos Muros, 25 de Janeiro de 2021).
Jesus escolhe a imagem da videira para tecer a alegoria de um amor perfeito que produz muito fruto – vide, sarmentos, muito fruto. Ora, vejamos como a escolha da videira é certeira e significativa.
Juntamente com a figueira e a oliveira, a videira é uma das plantas domésticas mais comuns na Palestina. Na literatura bíblica, a videira é impregnada de um rico sentido simbólico. É uma planta trepadeira, resistente ao calor e ao frio, cujos frutos servem para comer e produzir o vinho e seus derivados. Uma videira bem cuidada pode durar até 125 anos ou mais. Pode produzir ao mesmo tempo 40 cachos de uvas, e cada cacho de uvas pode carregar 70 a 100 unidades.
A natureza desta planta, a sua longevidade e o facto de ser trepadeira, resistente às mudanças climáticas e de ser extremamente fértil, remete-nos à imagem de um Cristão que é chamado a sair do seu isolamento, a abraçar o mundo, enquanto resiste às suas oposições e intempéries. Dos seus frutos abundantes e deliciosos, usados para diversas finalidades, produz-se também o vinho, símbolo de festa e de alegria, de amizade e de comunhão. Deste modo, o cristão é chamado à fertilidade, a produzir frutos abundantes de amor que ao mesmo tempo alimentam e inebriam a humanidade.
Na sua última ceia, Jesus partilhou vinho com os seus discípulos, fruto da videira, símbolo do seu próprio sangue. Assim como o vinho de uvas é indispensável na celebração da Eucaristia, assim também o cristão deve ser para o mundo.
Com esta pequena explicação podemos perceber o teor das palavras de Jesus no evangelho de hoje quando diz: «Fui eu que vos escolhi e destinei, para que vades e deis fruto e o vosso fruto permaneça». O amor é o fruto que se espera dos discípulos de Cristo. Na alegoria da videira, Jesus nos dá o exemplo de um verdadeiro amor. Como uma videira, o amor é fecundo e resistente. Como os ramos da videira, o amor abraça, não repele. Como as uvas, o amor sacia, não despoja. Como o vinho de uvas, o amor inebria, não intoxica… «Porque o amor vem de Deus» (1 Jo 4,7).
Leituras do dia: Actos 10,25-26.34-35.44-48; Sal 97 (98); 1 Jo 4,7-10; Jo 15,9-17