Depois de, no domingo passado, o primeiro do tempo da quaresma, termos estado com Jesus, no deserto, durante 40 dias, para aprendermos a fazer face às sugestões do maligno, neste domingo, o segundo da quaresma, Jesus nos convida a subir ao Monte Tabor, para nos mostrar a meta para a qual se dirige e nos indicar o caminho para a alcançarmos: a escuta obediente à sua Palavra. O tema da “obediência”, de facto, é o fio condutor das leituras deste domingo.
Na primeira leitura, através do relato do “sacrifício de Isaac” (Gen 22,1-2.9a.10-13.15-18), Abraão é apresentado como aquele que, confiando que Deus providenciaria tudo o que lhe fosse necessário para o holocausto, obedeceu cegamente, aceitando a ordem divina, sem oferecer resistência, mesmo que em causa estivesse o seu único filho, o filho da promessa, o filho da velhice e, por isso, foi abençoado. Dentre os vários sentidos dados a este texto, prevalece como o mais profundo aquele que aponta para a fé do patriarca Abraão. Ele “ouviu a voz de Deus”.
O “sacrifício de Isaac” de que nos fala a primeira leitura costuma também ser lido como o prenúncio do sacrifício de Cristo. Neste sentido, a primeira e a segunda leitura estão intimamente ligadas. São Paulo, no trecho da carta aos Romanos que hoje escutamos, afirma que Deus “não poupou seu próprio filho, mas o entregou por todos nós…” (cf. Rm 8,32). Ora, Se Abraão é um modelo de obediência, porque “ouviu a voz de Deus”, modelo ainda mais perfeito de obediência” é o Cristo, porque se fez obediente “até a morte e morte de Cruz” (cf. Fl 2,8).
No evangelho da “transfiguração do Senhor” (Mc 9,2-10) – havida “seis dias depois” da confissão de Pedro, em Cesareia de Filipe e, imediatamente a seguir, o primeiro anúncio da paixão de Jesus, ao qual o mesmo apóstolo Pedro se opôs, quando ouviu falar de morte e ressurreição, tendo Jesus o repreendido e logo em seguida afirmado que, para ser seu discípulo, era necessário “negar-se a si mesmo, tomar a cruz e segui-lo” (cf. Mc 8,34) – Jesus toma consigo Pedro, Tiago e João, os três discípulos mais íntimos, aqueles que ele quis perto em alguns momentos particulares da sua vida e, subindo ao Monte Tabor, revela brevemente o mistério da sua pessoa, deixando-se ver na sua “glória”. No meio dessa grande manifestação divina, aparecem Moisés e Elias, a Lei e os Profetas, que “conversam” com o Cristo. Os apóstolos contemplam o Mestre na sua glória e percebem que, n’Ele, se cumprem as Escrituras. O ponto central da cena, porém, é a “voz do Pai” que se faz ouvir a partir da nuvem: “Este é o meu Filho amado, escutai-o!”. Este imperativo, “escutai-o!”, não se dirige apenas a Pedro, Tiago e João, mas aos discípulos de Cristo de todos os tempos, a nós, inclusive.
Ser obediente à “voz” de Deus, escutando o Cristo, o servo obediente, que escuta e realiza em tudo a vontade do Pai, é o verdadeiro discipulado. Acolhamos, pois, o que o o Cristo nos diz e estejamos atentos à sua Palavra reconhecendo-a como o caminho da vida que nos conduz à salvação. As observâncias da santa Quaresma sejam, portanto, um meio que nos conduz às alegrias da Páscoa do Senhor.